Cecília Meireles (Rio de Janeiro, 7 de novembro de 1901 — Rio de Janeiro, 9 de novembro de 1964), foi uma jornalista, pintora, escritora e professora brasileira.
Durante uma entrevista, Cecília disse que “em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar e nem me espantei por perder”. A infância solitária rendeu à futura escritora dois pontos que, para ela, foram positivos: “a solidão e o silêncio”.
Poemas de Cecília Meireles neste site
Retrato
Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
– Em que espelho ficou perdida
a minha face?
Som
Alma divina,
Por onde me andas?
Noite sozinha,
lágrimas, tantas!
Que sopro imenso,
Alma divina,
Em esquecimento
Desmancha a vida!
Deixa-me ainda
Pensar que voltas,
Alma divina,
Coisa remota!
Tudo era tudo
Quando eras minhas
e eu era tua,
alma divina!
Encomenda
Desejo uma fotografia
como esta — o senhor vê? — como esta:
em que para sempre me ria
como um vestido de eterna festa.
Como tenho a testa sombria,
derrame luz na minha testa.
Deixe esta ruga, que me empresta
um certo ar de sabedoria….
Não meta fundos de floresta
nem de arbitrária fantasia…
Não… Neste espaço que ainda resta,
ponha uma cadeira vazia.
Monólogo
Para onde vão minhas palavras,
se já não me escutas?
Para onde iriam, quando me escutavas?
E quando me escutastes? – Nunca.
Perdido, perdido. Ai, tudo foi perdido!
Eu e tu perdemos tudo.
Suplicávamos o infinito.
Só nos deram o mundo.
De um lado das águas, de um lado da morte,
tua sede brilhou nas águas escuras.
E hoje, que barca te socorre?
Que deus te abraça? Com que deus lutas?
Eu, nas sombras. Eu, pelas sombras,
com minhas perguntas.
Para quê? Para quê? Rodas tontas,
em campos de areias longas
e de nuvens muitas.
Despedida
Por mim, e por vós e por mais aquilo
que está onde as outras coisas nunca estão,
deixo o mar bravo e o céu tranqüilo:
quero solidão.
Meu caminho é sem marcos nem paisagens
E como o conheces? _ me perguntarão.
_ Por não ter palavras, por não ter imagens.
Nenhum inimigo e nenhum irmão.
Que procuras? _Tudo. Que desejas? _Nada.
Viajo sozinha com o meu coração.
Não ando perdida, mas desencontrada.
Levo o meu rumo na minha mão.
A memória voou da minha fronte.
Voou meu amor, minha imaginação.
Talvez eu morra antes do horizonte.
Memória, amor e o resto onde estarão?
Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.
(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão!
Estandarte triste de uma estranha guerra…)
– Cecília Meireles
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