Não me importa a palavra, esta corriqueira.
Quero é o esplêndido caos de onde emerge a sintaxe,
os sítios escuros onde nasce o “de”, o “aliás”, o “o”, o “porém”
e o “que”, esta incompreensível
muleta que me apoia.
Quem entender a linguagem entende Deus
cujo Filho é o Verbo. Morre quem entender.
A palavra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda,
foi inventada para ser calada.
Em momentos de graça, infrequentíssimos,
se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão.
Puro susto e terror.
-Adélia Prado
PRADO, Adélia. Poesia reunida. 8ª ed. São Paulo: Siciliano, 1999, p. 22.